A questão da verdade: produção e historicidade
“AS VÁRIAS
MANEIRAS DE PENSAR”
A Filosofia
como possibilidade de possibilidades
1. Introdução
do Grupo de Estudo: Considerações e compreensão do texto de Ernildo Stein – A experiência do exercício foi muito positiva, pois
cada membro procurou refletir, ao termo de leitura individual e partilha
posterior em sala de aula, e de certa forma recriamos o texto de Ernildo Stein.
O autor é sugestivo no título –“As várias
maneiras de pensar”. De fato, existem várias maneiras de pensar e a sua
proposta de definir uma maneira pela qual poderíamos dizer – isto é Filosofia
no sentido estrito do termo – foi para nós um exercício de altíssima
dificuldade. Entre nós mesmos houve controvérsias. E já adiantamos – obviamente
não chegamos a conclusões definitivas. Por certo que isto ressalta a idéia de
que cabe a Filosofia permanecer neste mistério sobre sua especificidade. Assim
sendo, a especificidade da Filosofia pode ser evidenciada, entre tantos
aportes, pelo menos em dois enunciados: Primeiramente ao citarmos Kant e sua idéia
de que – não se aprende filosofia, mas a
filosofar, pois disso decorreria que a Filosofia não teria supostamente uma
estrutura científica, mas apenas uma capacidade phronemática – ou seja, estaria
em cada ser humano como uma capacidade prática – de reta razão no agir. Noutro
aporte, poderíamos recorrer a idéia de que a Filosofia é: Reaprender a ver o mundo – na perspectiva de Merleau Ponty. Cremos
que as definições não estão incorretas, porém não dão conta da complexidade da
Filosofia enquanto tal. Filosofar e estudar Filosofia é assumir “ad intra e ad
extra” um novo posicionamento no mundo, em relação a todas as coisas. No dizer
de Boff:
Cada um hospeda dentro de
si uma águia. Sente-se portador de um projeto infinito. Quer romper os limites
apertados de seu arranjo existencial[1].
Mas não só estes citados, mas todos os filósofos estão
ao mesmo tempo com razão e sem razão, pertinentes e não pertinentes ao
definirem e assumirem posturas controversas e até mesmo contraditórias em
relação ao que de fato seja a Filosofia. Eis o dilema: a resposta que
procuramos, se é que estamos a procurar alguma resposta é do cunho da
complementaridade ou da assimilação no que cada postura tem de bom? Eis a
questão posta. Em linhas gerais este é um dos problemas verificados por Ernildo
Stein. Em síntese seu texto evidencia o paradoxo das definições em relação à
especificidade da Filosofia e realça a variedade das questões produzidas pelo
processo de filosofar. Criteriosamente, é o mesmo Stein que nos oferece a
definição – “a Filosofia nunca é Filosofia”
(cf.p.18). Por isso é a Filosofia uma amalgama criteriosa e extensa [...] quase
mistério? Em grande parte ela está compreendida como História. A historiografia
das ditas “escolas”, dos temas, dos interesses, dos momentos e períodos
específicos do pensamento que, de maneira sistemática, é o que inúmeros
professores de Filosofia, tanto no ensino médio como na iniciação universitária
trabalham com os alunos. Este procedimento se torna em primeiro plano a
definição e a função da Filosofia no processo pedagógico-educacional. A
compreensão da filosofia fica referendada naquilo que cada filósofo ao seu
tempo pensou e ensinou. Este é ao mesmo tempo o caráter conceitual da
Filosofia. Na verdade, por curiosidade partilhada no grupo, alguns professores
e formados em Filosofia não sabem argumentar a favor da disciplina no sentido
de seu lugar na grade educacional. Trabalhar com definições ou com provocações
é um proprium-filosófico, pois, por exemplo, a aporia platônico-socrática é uma
definição inacabada, porém trata-se de uma definição. Longe de ser a coisa tal
que sem a qual o mundo continua o mesmo, a Filosofia se movimenta na crítica.
Este termo é um dos mais complexos e controversos do léxico abrangente da
Filosofia. O que é a crítica? Depois da Escola de Frankfurt – e seus autores
com teoria crítica – se subentende a
crítica da Filosofia de um modo bem específico. É a crítica do sistema
alienante no qual estamos inseridos. Este modo citado dá conta do que seja a
crítica filosófica? Se por um lado – muitos defendem a idéia de que a
melancolia é um devir criativo no filósofo, por outro ser ou viver acrisolado –
viver em crise é uma etapa efetiva para que sejamos de fato credenciados como
“filósofos”. No fundo, o que para alguns é triste e para muitos é o sentido
pessimista da Filosofia, o fato da incompletude é dado evidente que temos que
lidar. Esse fato se depara com a situação experimentalista e hipotética do
mundo pós khuniano, em outras palavras, fenomenalista e empirista.
Hodiernamente a Filosofia está “encarcerada” no “mito da hipótese”. Levamos o
sentido da Filosofia a uma prisão – as hipóteses, àquilo que se pode comprovar.
Definição pobre no sentido estrito da potencialidade da Filosofia, porém é
ratificada pela Academia atual. Este é o cenário de onde partimos. E um dado
interessante para encerrar nossa introdução: terminaremos este trabalho e não
daremos conta de dizer o que é – de fato a – Filosofia.
2.
Enumeração dos parágrafos de Ernildo Stein:
a)
Considerações prévias: critério para análise das
filosofias e proposta de uma tipologia - § 1-6.
b)
O Tipo Dogmático confessor e guia - § 7-9.
c)
O Tipo Artístico - § 10.
d)
O Tipo Científico - § 11.
e)
O Tipo Filológico-Hermenêutico - § 12-13.
f)
Considerações finais: relatividade da tipologia e
incompletude da filosofia - § 12-13.
3. Apresentação de critérios do pensar
filosófico: Compreensão do texto parágrafo a parágrafo:
a) Do
desprezo ao inconformismo em relação à Filosofia – No atual cenário da educação, e já trazendo na bagagem
este peso de ser desprezada, a Filosofia não atrai estudantes para sua
“clareira”. A Filosofia teria perdido a sedução? Aliás, algum dia já possuiu? O
problema – de antemão – não está somente na postura da ciência enquanto tal,
mas numa partilha de mea culpa
coletiva e histórica. Desprezada em muitas instituições, avacalhada em
posicionamento de horário na educação Estadual, Municipal e Particular – é a
última aula da sexta feira e quando se tem que “cortar” disciplinas é a
primeira da lista. “Pra que me serve
isto?” perguntam-nos os alunos. Às vezes nós mesmos não sabemos responder.
Dizemos – é pra pensar com criticidade.
Será? O desprezo é visível e é um grande desafio aos que se aprofundam nesta
maravilhosa ciência que não sabemos definir. Ao mesmo tempo rotula-se a
Filosofia como inconformidade, sobretudo política ou discursiva e arruaceira.
Dizem que os filósofos são todos malucos, gente sem o que fazer. Generalizações
[...] como em todo lugar – tem gente que macula nossa vocação filosófica.
Cremos, não obstante que é sinal da Filosofia a inconformidade, porém somente
este sentido não dá conta de responder o que estamos a procurar e pensar neste
momento. Disso decorre o velho dilema [...].
b) Da doxa e
da epísteme: entre o senso comum e o exercício sadio do entendimento – É o que mais se comenta numa aula inaugural ou num
primeiro bimestre de Filosofia como um todo. A Filosofia não é senso comum,
porém não o negamos. A Filosofia seria um “espanto” desvinculado do
conhecimento vulgar do cotidiano? E fica a definição indecisa, o que é ela
então? Necessitamos de um procedimento diverso. Cremos que Stein indicaria:
c) A
Auto-heterologia da Filosofia – Uma
espécie de libertação da Filosofia. Francis Bacon fez uma proposta semelhante
quando disse a respeito do espírito humano em relação aos ídolos. Eles continuam
encarnados no processo do filosofar. Uma nova evidência de paradoxo. O que
significa o termo auto-heterologia? Primeiramente não sabemos nem se este termo
existe. Mas se não existir não tem problema. Porque se o filósofo estudado no
momento por nós é Martin Heidegger, e ele foi um dos que mais abusou, no bom
sentido da palavra, de praticar neologismos, nós também vamos tentar explicar o
que queremos indicar com o conceito. O ato de filosofar é um ato de autonomia.
Mas a autonomia filosófica é marcada pela diferença específica do lógos que de
per si não nos pertence e não pertence a ninguém e nem mesmo a nenhuma postura
histórica da Filosofia. Por isso, cabe a Filosofia enquanto tal permanecer em
paradoxo, ser nunca. Será esta sua identidade? Concebendo-a assim ela não teria
um lócus determinado. Portanto [...]
a Filosofia é situada em um não lugar – na
utopia.
d) A utopia
das Introduções à Filosofia – Esta
dinâmica exposta no item passado é compreendida de um modo melhor neste termo –
utopia – enquanto não lugar. A
Filosofia não tem lugar. Como fica então as posturas de Pierre Vernant ou de
outros autores que reconhecem ou trabalham com o milagre ocidental – o
logocentrismo grego? Ninguém é dono do Lógos.
Basta lermos fragmentos, livros, a religiosidade Oriental que nos deparamos
com uma sabedoria tanto quanto excelsa como a Filosofia Ocidental. Essa busca
de especificidade da Filosofia é o fundamento do qual o autor E. Stein parte e
nós também partiremos para pensar a partir das tipologias o exercício puramente
da Filosofia. Esforço inútil?
e) A
Filosofia definida em Tipologia (?) – A
proposta de tipologia de Stein é uma forma de esclarecimento em relação a um
determinante comum do filosofar. São tantos procedimentos e critérios que já
nos perdemos do foco. É possível definir a Filosofia? E como todo texto
filosófico, Stein tem um método de abordar a problemática. Sem método não há
investigação filosófica [...] será?
a) O
Filósofo da Verdade perene – O
filósofo do tipo dogmático é o que crê – rotula-se e fundamenta-se na verdade é
perene. No dogmático há a seguinte postura: o homem é a medida e o mundo tal
qual se vê é o suporte do que se crê. Não se têm muitas questões sobre o porquê
das coisas. A ingenuidade racional é um adereço implacável. Filosofia sem
crítica – de fato este tipo é plausível? Se sim, cremos que não, mas em que o
dogmatismo nos será útil? Inclusive muitos filósofos, até mesmo marxistas ou
marxianos, nitzcherianos [...] são dogmatistas. No fundo todos nós somos em
algum dado momento ou circunstâncias de nosso proceder existencial e teórico. No coração do dogmatismo há dogmáticos
que pensam assim: “A filosofia termina
em mim (Hegel)” – A partir do que sou defino o mundo. Protágoras é o
referencial [apesar de não ser citado]. Que cada um acredite nas verdades
propostas como universais. É a postura do filósofo modelo. Vida e pensamento
estão emaranhados, “confundidos”. Há ainda dogmáticos que pensam e vivem em
meio as grandes verdades. A coerência entre a vida e o pensamento não está nos
planos destes sujeitos. Sua tarefa é apontar o caminho, mesmo que ele mesmo não
venha a segui-lo.
b) O
filósofo esteta – Ele está preocupado
com a construção da verdade que apresenta, na orquestração do sistema a ser
montado. É um sóbrio-embriagado-poeta. O jogo da filosofia é muito instigador a
este tipo. É sóbrio porque não é ingênuo, é embriagado porque acredita no
desvelamento das coisas e é poeta porque tem sensibilidade em relação a um
simples termo lingüístico. Portanto este tipo valoriza a linguagem, enquanto
possibilidade, pois as palavras são procuradas na proporção de sua gravidez
especulativa no sentido de um constante confronto com ela própria.
c) O
filósofo lógico-sistemático - É um
iludido pelos dois tipos já dispostos e apresentados. A ingenuidade e jogo da
linguagem não fazem parte de seu âmago filosófico. Não é central, porém não as
desprezas completamente. Porque as conquistas científicas se dão gradativamente
por superação. O tipo valoriza as conquistas humanas pela via da técnica,
demonstra a fragilidade dos argumentos sem fundamentação consistente, assume a
postura da modernidade em relação ao “adeus metafísica”, mas acima de tudo, é aplicador
da proposição – verdadeiro é o verificável. É o suporte e a definição de
Filosofia mais evidente no cenário em que estamos vagueando.
d) O
filósofo historiador e intérprete – Neste
tipo ocorre uma preocupação histórica. Cada corrente, cada pensador é
valorizado e minuciosamente estudado em suas posturas diversas. Há uma
preocupação com o mito, com a palavra, com a metafísica, com os opostos dos já
citados, enfim, tudo e todos são termos de especulação e investigação. Quer ir
ao filósofo e não simplesmente ao que “tornaram” o filósofo e sua produção com
o decorrer dos tempos. Um exemplo claro é a distinção entre o pensamento
marxista e o pensamento marxiano, ou ainda entre o pensamento tomista e o
pensamento tomasiano. Quer este tipo beber diretamente da fonte. Um marxiano –
no sentido filológico e hermenêutico da palavra – Prof. Dr. José Paulo S. Neto
afirma que existem marxistas que nunca leram Karl Marx. Isto vale para qualquer
corrente e qualquer filósofo. E por assim ser, o pensador característico deste
tipo procura ver uma unidade entre períodos inteiros, procurando encontrar um
elemento unificador. Esta proposta é de filtragem ou de mesclagem? Das postas,
nosso grupo crê ser a mais consciente da missão predisposta por Stein.
5. Descrição
de palavras chaves de cada item do texto
a) Considerações
e compreensão do texto de Ernildo Stein – Definição e especificidade.
b) Considerações
prévias: critério para análise das filosofias e proposta de uma tipologia
b1)
Do desprezo ao inconformismo em relação à Filosofia – Pra que serve a Filosofia?
b2) O velho
dilema da doxa e epísteme: entre o senso comum e o exercício sadio do
entendimento – Senso comum e
exercício sadio do entendimento.
b3) A
Auto-heterologia da Filosofia – Paradoxo
e Libertação.
b4) A utopia
das Introduções à Filosofia – O “não
lugar” da Filosofia –
Utopia.
b5) A
Filosofia definida em Tipologia (?) – Critérios
para filosofar.
c) Apresentação
dos critérios do pensar filosófico:
a) O filósofo
da verdade perene: crença ingênua / herói
/ modelo/ dogmas.
b) O filósofo
esteta – Harmonia da Linguagem.
c) O
filósofo lógico-sistemático – Rigorosidade
e Verificabilidade.
e) O filósofo
historiador e intérprete - Análise
crítico-interpretativo.
6. Frases
chaves para todo texto – [...] A Filosofia
é a luta constante contra as evidências ingênuas [...] (p.18) [...] “Somente
porque se nunca se realiza é que a Filosofia permanece Filosofia” (Ibidem).
7.
Palavras-chaves do Texto de modo geral: “A contínua busca sobre as
possibilidades do real” (p.18)
Será que nunca definiremos a Filosofia ou a Filosofia
se ancora na condição de nunca ser definida? Mais do que um paradoxo
demagógico, o enunciado posto é o fato – é o peiras e o apeíron da
Grécia arcaica – é, portanto o limite
e o ilimitado do processo íntimo do filosofar. Nas palavras escolhidas por nós
– “Paradoxo” e “Questões”, de certo modo se findam o que evidenciamos em
palavras até o momento, mesmo que uma conclusão, de fato, não se constatou. A
Filosofia é paradoxo porque lemos, refletimos e partilhamos e não chegamos a
uma conclusão da sua especificidade. Não sabemos nem mesmo classificá-la ou
demonstrar sua cientificidade, apesar de reconhecermos que nela há. A outra
palavra seria “Questões”. Filosofia que se preze termina em questões. Em nosso
texto há várias. As respostas são menos interessantes e importantes em
detrimento as questões que são bem formuladas. Filosofia torna-se em grande
escala sinônimo de perguntar bem perguntado. E assim, dentre as várias
possíveis questões destacamos estas: Pra que serve então a Filosofia? O que
justifica a indiferença que ela enfrenta há muitos anos no âmbito social? Num
outro aporte que supõe a protologia da Filosofia, o senso comum, a nossa
proposta é incompreendida e no campo acadêmico é adjetivada como inconformidade
disso e daquilo, “rebeldes sem causa”. Entre outras disciplinas mais ritmadas e
cadenciadas em foco é quase comparada a maluquice, enfim, desbrava-se a
inutilidade? Rótulos [...] Rótulos. Nisto consiste o que Stein chama de
exercício sadio do entendimento. Ter claro que o que definimos não dá conta da
“quididade” do que acabamos de dizer que sabemos. O que significa dizer que uma
definição qualquer de Filosofia não dá conta do que seja de fato a Filosofia.
Assim sendo nos deparamos com um Paradoxo e com uma missão libertadora em
relação aos critérios do filosofar. A libertação do que não é Filosofia é o
primeiro passo para que no final de um processo que não sabemos o quanto
demorará teremos resultados sobre o conceito que almejamos. Ilusão, porém
missão. Por isso a crença ingênua, o heroísmo, o empirismo hipotético e
verificacionista, bem como a postura modelar, tanto quanto o aforisma – faça o
que eu digo, mas não faça o que eu faço, devem ser analisados sob o prisma da
sobriedade, da embriaguez, do jogo das palavras na linguagem e na poesia. Neste
quadro montado a História é o lugar de onde partimos dos pensadores em suas
lonjuras, porém a Filosofia – se guarda “divinamente” – em um não lugar, quem
sabe no nunca. É disso que decorre a limitação e relatividade da tipologia e da
evidencia da incompletude, do “não lugar” paradoxal e questionante da
Filosofia.
[1] BOFF, Leonardo. A
Águia e a Galinha – Uma metáfora da existência humana. Petrópolis: Vozes,
1996, p. 04.
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